Aqui no blog já falamos de histórias dos famosos clubes de moto 😠(Hells Angels, Pagans, Outlaws e Bandidos) que são os considerados os “1%ER”, mas ainda não havíamos falado da origem deste termo...
Essa história começa entre 3 e 6 de julho de 1947 na pequena cidade de Hollister, Califórnia, onde anualmente a AMA (American Motorcyclist Association) organizava o “Gypsy Tour motorcycle rally “.
Era um evento criado para ser apenas um encontro festivo entre motociclistas, mas os fatos ocorridos naquele ano chocaram a sociedade americana e, ao longo do tempo, desencadearam muitas outras coisas na história do mundo das 2 rodas. Tudo isso acabou ficando na história como o “Hollister Riot”.
As coisas começaram a sair do controle quando cerca de 4.000 motociclistas (10% mulheres) chegaram para participar da festa, era um número muito maior do que o esperado pelos organizadores.
Literalmente, os participantes “tomaram conta” da pequena cidade, buscando os shows, socializar e, como não, beber além da conta causando agitação e baderna.
Veremos que, perante todo o potencial de confusão, ao final do evento os danos foram muito menores do que poderiam ser, ainda assim a repercussão negativa foi enorme!
Para entender o porquê de tanta repercussão negativa, temos que olhar com atenção o momento pelo qual passava a sociedade americana, dominada como nunca por valores conservadores. Muitas famílias e ex-combatentes viviam algum trauma pós Segunda guerra mundial, isso significava tolerância zero para confusão ou dificuldades de readaptação a uma vida “normal”.
Inúmeros veteranos sentiam dificuldades em se reajustar a vida civil, fosse por falta de aventura, da adrenalina ou dos seus “irmãos” de armas, muitos de fato nunca conseguiram superar seus horrores e traumas.
Indiretamente, esse sofrimento fortaleceu os clubes de motocicletas, entidades que "ofereciam" aventuras, perigos e camaradagem, além de existir farta e barata oferta de motocicletas excedentes das forças militares.
E o evento "Gypsy Tour" em Hollister? Já ocorria anualmente desde a década de 1930, só foi cancelado durante a 2ª guerra mundial, com o objetivo oficial de promover o turismo no dia quatro de julho, o Memorial Day.
Outros eventos semelhantes ocorriam em toda a América, mas Hollister era considerado um dos melhores por ser realizado numa cidade muito pequena (cerca de 4.500 pessoas) que o tratava como o "grande acontecimento do ano".
Voltando a 1947, os principais MCs da época estavam presentes: “The Pissed Off Bastards of Bloomington”, “The Booze fighters”, “The Market Theater Commandos”, “Top Hatters Motorcycle Club” e o “Galloping Goose Motorcycle Club”. A estrutura da cidade se mostrou totalmente despreparada para atender número de pessoas que chegavam, os 21 (!) bares não suportaram tanta gente e logo o pessoal começou a andar de moto completamente bêbados, jogar garrafas de cerveja nas janelas, tirar rachas e outras confusões menores. Não haviam hotéis também, logo os motoqueiros passaram as noites dormindo pelas calçadas e gramados.
A “imensa” força policial da cidade, composta por apenas 7 policiais, tentou parar com a bagunça montando barricadas, usando gás lacrimogênio e prendendo o máximo de embriagados possível, os bares fecharam duas horas antes do tempo, mas mesmo assim a agitação continuou até o término do evento, deixando muita sujeira e garrafas de bebidas vazias para trás.
Muitos moradores até sustentaram que não houve de fato uma depredação generalizada, os motociclistas apenas estavam extravasando sem causar grandes danos. O saldo final foram cerca de 50 pessoas presas, a maioria por embriaguez e perturbação da paz, também foi contabilizado 60 feridos sendo 3 em estado grave, mas nenhum morador da cidade esteve envolvido nestes incidentes.
Porém, os incidentes em Hollister foram, logicamente, explorados de maneira exagerada e sensacionalista pela imprensa americana, relatando que os motociclistas "assumiram o controle da cidade" instaurando um verdadeiro "pandemônio". O jornal “San Francisco Chronicle” descreveu o evento com os títulos "Havoc in Hollister" e "Hollister's Bad Time", comparando a atos de terrorismo.
Uma foto tirada por Barney Peterson, repórter do SF Chronicle, retratando um motociclista bêbado (Eddie Davenport, dos Tulare Riders motorcycle club) em cima de uma moto cercado de garrafas de cerveja virou o símbolo do “caos”.
A tal foto foi publicada pela revista Life, na edição de 21 de julho de 1947, transformando o assunto em escândalo nacional, afinal a Life era um dos principais meios de comunicação nos Estados Unidos na época.
Algumas testemunhas sustentaram, porém, que a foto foi encenada, outros defenderam Peterson dizendo que nada foi arranjado, interessante que o jornal SF Chronicle relatou o tumulto e não publicou a foto, mesmo Peterson sendo seu repórter.
Independente desta discussão, o resultado foi toda a opinião pública americana se voltar contra quem estivesse em cima de um veículo de 2 rodas.
A repercussão negativa foi tamanha que a AMA foi obrigada a divulgar uma declaração dizendo que não tinham envolvimento com os ocorridos em Hollister, dizia o comunicado: "o problema foi causado por um por cento que mancham a imagem pública de motocicletas e motociclistas, logo 99% dos motociclistas são cidadãos bons, dignos e respeitadores da lei".
O curioso é que atualmente a AMA sustenta não ter registro de ter emitido tal declaração, mesmo assim o termo “one-percenter” ainda é amplamente utilizado para descrever os clubes e motociclistas foras da lei.
No fim das contas, o tumulto de 1947 não teve mesmo graves efeitos sobre a cidade, tanto que o evento continuou sendo realizado anualmente na cidade.
Em 1997 foi realizada a comemoração do 50º aniversário, o resto ficou na história.