14/11/2016

Spirit of Ecstasy

Nos primeiros anos do século 20 o radiador era o local preferido pelas fábricas para colocar o emblema da marca, poderia ser na grade, na parte superior ou na tampa. Muitos clientes também gostavam de criar alguma forma de distinção e faziam suas próprias “criações artísticas”. Não podemos esquecer que nesta época o automóvel não era considerado apenas um “meio de transporte”, era muito mais um símbolo de status ou diversão para poucos afortunados.
Os primeiros modelos da Rolls-Royce utilizavam apenas o emblema da marca na parte superior do radiador, mas logo entenderam que só isso não seria suficiente para agregar prestígio e distinção aos seus clientes, era necessário reforçar a imagem de luxo e sofisticação.
A resposta veio com o famoso adorno de radiador com uma figura feminina de prata, o “Spirit of Ecstasy”, também chamado de "Emily", "Silver Lady" ou "Flying Lady".
Poucos sabem, no entanto, que a lady de prata guarda a história de um amor secreto entre um nobre e uma plebeia, história que permaneceu praticamente oculta por mais de uma década, exceto por um pequeno circulo de amigos.
John Walter Edward Douglas-Scott-Montagu, o segundo Barão Montagu de Beaulieu, em 1905 era um pioneiro do movimento do automóvel e editor da revista “Car Illustrated”. O barão tinha uma secretária de 22 anos chamada Eleanor Velasco Thornton, também conhecida como Thorn, eles se apaixonaram quando ela trabalhava para ele na revista.
Muitos justificam que a razão para a relação ter ficado em segredo foi a situação social e econômica de Eleanor, ela vinha de uma família muito pobre e uma relação com um nobre não era bem aceita pela sociedade da época. Mas, provavelmente, a razão verdadeira foi outra, pois o Barão Montagu era casado com Lady Cecil Victoria Constance Kerr desde 1889...
Para eternizar o seu amor o Barão Montagu encomendou ao escultor e amigo Charles Robinson Sykes, graduado no “Royal College of Art de Londres” e que trabalhava em Londres com patrocínio do nobre, um adorno personalizado para o capô de seu Rolls-Royce Silver Ghost, 1910.  
Sykes escolheu, ou foi aconselhado, a utilizar Eleanor Thornton como seu modelo. A estatueta foi desenhada com roupas esvoaçantes e a mão nos lábios sendo chamada “The Whisper” (O sussurro), hoje está em exposição no Museu Nacional Motor em Beaulieu. Apenas três ou quatro peças foram fundidas e destas acredita-se que apenas duas sobreviveram.
Na mesma época a Rolls-Royce estava preocupada com alguns proprietários que estavam criando ornamentos "inapropriados" para seus carros. Claude Johnson, então diretor executivo da marca, foi encarregado de buscar um novo adorno mais digno e gracioso para tornar-se uma marca genérica da Rolls-Royce.
Johnson também fez uma encomenda para Sykes, com as especificações que deveriam transmitir "o espírito da Rolls-Royce”, ou seja, a “velocidade com o silêncio, ausência de vibração, aproveitamento misterioso de grande energia e um organismo vivo bonito de excelente graça...".
Charles Sykes mostrou algumas ideias para Claude Johnson, mas os resultados não impressionaram. Foi então que Sykes sentiu que uma representação feminina seria mais apropriada e decidiu modificar “The Whisper”. O primeiro modelo foi chamado de “O Espírito de velocidade”, mais tarde “Spirit of Ecstasy”.
Henry Royce, um dos fundadores da marca, no início achou que a estatueta não iria agregar nada aos carros, na verdade afirmava que prejudicava a visão do motorista, mas em 06 de fevereiro 1911 foi finalmente apresentado para a Rolls-Royce o "Spirit of Ecstasy", não era difícil notar a semelhança com o "The Whisper”, afinal ambas as obras utilizaram a mesma modelo.
Entre 1911 até 1914 o adorno era prateado feito com níquel ou liga de cromo para não incentivar roubos, apesar de ser considerado um acessório quase todos os modelos adotavam até virar um item de série no começo dos anos 1920. A Rolls-Royce assumiu a fundição das figuras em 1948, até 1951 a fábrica manteve a inscrição com o nome do artista.
Ao longo de sua história o desenho teve onze variações, principalmente em função das mudanças nas carrocerias que levaram a reduções no tamanho da mascote. Em 1930 Sykes foi novamente encarregado pela fábrica de criar uma versão menor para permitir uma visão mais clara para os motoristas. Então em 26 de Janeiro 1934 foi apresentada uma versão agachada, mas depois voltou a posição original e assim permanece até hoje.
A partir de 2003 foi adotado um modelo padrão de 3 polegadas, por segurança o adorno passou a ser montado sobre um mecanismo de mola projetado para retrair instantaneamente se for atingido de qualquer direção. Também existe um botão no painel para aumentar ou diminuir a altura do emblema quando pressionado.
Como ícone da sofisticação da marca, ela pode ser feita de aço inoxidável polido, banhado a ouro com 24 quilates ou de cristal fosco iluminado, também existem versões personalizadas em uma pintura preta fosca ou cravejado em diamantes.
Mas, como finalizou a história de amor entre Eleanor e o Barão Montagu?  Infelizmente de modo trágico, ela morreu em 30 de dezembro 1915 no naufrágio do navio SS Persia, torpedeado por um submarino alemão ao sul de Creta. Eleanor voltava de uma viagem com Lord Montagu, que assumira um comando na Índia durante a primeira guerra mundial. Ele também foi dado como morto, mas sobreviveu após vários dias à deriva em um bote salva-vidas.
Apesar de tudo, seu amor foi eternizado, o Barão Montagu atingiu o seu desejo.

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