30/11/2016

John Wyer

Aqui no blog temos uma consideração especial sobre os grandes “team managers”, nenhum piloto ou equipe lendária existiria sem um chefe de equipe fora de série como Alfred Neubauer ou Colin Chapman (neste caso um grande projetista também). 
Certamente o inglês John Wyer faz parte deste seleto grupo!!
Alguns fãs de corridas talvez você lembrem de John Wyer apenas pelo nome, mas com certeza vão lembrar-se da mitológica pintura azul e laranja dos seus carros patrocinados pela Gulf Oil e que fizeram história em Le Mans e nas corridas de longa duração.
John Wyer nasceu em 11 de dezembro de 1909 na cidade de Kidderminster, Inglaterra, aos 18 anos ele começou a trabalhar como aprendiz na “The Sunbeam Motor
Peter Collins, Reg Parnell, Tony Brooks e John Wyer na Aston Martin
Company” até se formar em engenharia automobilística. Atuou na Solex (carburadores) como engenheiro e gerente geral de 1933 até 1950, então mudou para a equipe Aston Martin para ser o diretor de corridas.
A primeira vitória em Le Mans de uma equipe sob seu comando veio apenas em de 1959, com os pilotos Roy Salvadori e Carroll Shelby no modelo DBR1, pela Aston Martin ele também venceu os 1.000 km Nürburgring em três anos consecutivos.
Apesar de não vencer novamente em Le Mans com a Aston Martin, Wyer ficou na equipe até 1963, então decidiu mudar-se para a Ford para gerenciar um novo, arriscado e promissor projeto com um novo modelo, um tal GT40!
Em 1964 foi criada a Ford Advanced Vehicles (FAV) com instalações em Slough, nos dois primeiros anos os resultados dos GT40 foram fracos, principalmente por problemas de confiabilidade mecânica, então a Ford decidiu dar o controle técnico para Holman Moody e Carroll Shelby e conseguiram a glória de derrotar a Ferrari em Le Mans, em 1966 e novamente em 1967.
Talvez pela sensação de "missão cumprida" a Ford decidiu fechar a divisão FAV após 1966, John Wyer e John Willment formaram J.W. Automotive Engineering LTD (JWA) e assumiram o controle da fábrica de Slough. 
Os dois continuaram a construir e evoluir os GT40s “Homologated Group 4” de pista e os modelos de estrada M1K3, Wyer era o gerente da equipe nas pistas onde era sempre muito presente. 
Em 1967, com apoio da Gulf Oil, Wyer criou o Mirage M-1 e já neste ano venceu os 1.000 km de Spa, mas em 1968 a FIA introduziu uma nova regra limitando os motores dos protótipos a 3.000 cm3 e dos carros esportes de até 5.000 cm3 (com 50 unidades produzidas para homologação), estas novas regras prejudicaram a competitividade do M-1 e Wyer apostou novamente nos "velhos" GT40. 
Eles conseguiram um grande feito em 1968 ao vencer o campeonato mundial para a Ford derrotando os favoritos Porsche 907 de 2.200 cm3, a tática foi aproveitar ao máximo a potência superior dos V8 americanos nas pistas mais longas, já que não eram tão competitivos em pistas menos velozes. 
Vieram duas novas vitórias em Le Mans, em 1968 (Pedro Rodríguez e Lucien Bianchi) e em 1969 (Jacky Ickx e Jackie Oliver), então os GT40 se renderam a obsolescência. 
Wyer firmou uma nova parceria com a Porsche para utilizar os novíssimos 917 tornando-se o principal parceiro da fábrica, foi responsabilidade da JWA o desenvolvimento da cauda “Kurzheck” em 1970, criando o lendário 917K.
Le Mans 1975
As homéricas batalhas entre os 917K (das equipes JWA Gulf Racing e Martini Racing) contra as Ferrari 512 marcou a época de ouro das corridas de resistência, principalmente por contar com pilotos do nível Vic Elford, Derek Bell, Jo Siffert, Richard Attwood e Pedro Rodríguez. Apesar do domínio a JWA não venceu em Le Mans em 1970 e 1971, muitos pensam o contrário pelo filme “24h de Le Mans” com o astro Steve McQueen e seu Porsche 917K nas cores da Gulf, mas isso foi só cinema...
Em 1972, a FIA alterou de novo as regras e baniu os motores de 5.000 cm3 dos carros esporte e os 3.000 cm3 para os protótipos, o que atingiu em cheio os 917 e 908, Wyer então partiu para desenvolver protótipos Gulf-Mirage usando como base os motores de F1 Cosworth DFV de 3.000 cm3. 
A equipe JWA no Hotel de France
O DFV destruía a concorrência na F1, mas tinha sérios problemas de durabilidade nas corridas de longa duração (quebras por excesso de vibração), somente após 3 anos de muito trabalho a JWA voltou a vencer em Le Mans, foi em 1975 com Jacky Ickx e Derek Bell.
Uma curiosidade de Wyer e sua equipe era que eles utilizavam o "Hotel De France" como base antes das corrida, fizeram isso entre 1953 até 1975, os carros eram cuidados dentro do pátio do hotel e em uma garagem próxima até serem levados para a corrida.
A vitória de 1975 foi a ultima vitória de John Wyer em Le Mans, ele decidiu aposentar-se aos 64 anos de idade e vendeu a equipe para Harley Cluxton. 
John Wyer faleceu em oito de abril de 1989, em Scottsdale, Arizona.

22/11/2016

Gasser

Embora nem sempre devidamente reconhecidos, os “gassers” foram grandes pioneiros no que hoje são as corridas de arrancada profissional (dragsters). Estes carros de aparência esquisita surgiram no final dos anos 1950 e tiveram seu auge em termos de prestígio no início dos anos 1970.
Quem não se lembra das gravuras dos monstros de Ed Roth empinando gassers super envenenados?
A história começa nos anos 1950, as corridas de arrancada passavam por mudanças sensíveis, se antes as corridas aconteciam em amplos locais naturais como os lagos secos El Mirage e Bonneville, aos poucos passaram a ocorrer provas em ruas ou pistas fechadas, ainda que sempre em linha reta. 
Se antes o que valia era a velocidade máxima final, agora a disputa era contra o relógio, vencia quem levava menos tempo e não mais quem atingia somente as maiores velocidades.
Os carros e pilotos tiveram que mudar para se adaptar a nova dinâmica destas corridas, embora as receitas básicas de preparação continuavam por aliviar o peso do carro e conseguir mais potência. Para resolver o primeiro problema o acabamento interior era retirado, vidros trocados por plexiglass e partes da lataria trocadas por fibra de vidro. 
Já para resolver o segundo "problema", o mais comum era a instalação de motores maiores (geralmente V8s Ford Flathead ou Pontiac 389), também era comum o uso de compressores mecânicos (Paxton).
Só que essas "soluções" criavam um outro e grande problema; Como conseguir domar tanta cavalaria e manter o carro em linha reta?
Entre tantas tentativas uma começou a chamar atenção pelo visual diferenciado dos carros, os Gassers. O nome veio porque estes carros utilizavam gasolina e não etanol ou nitrometano, normalmente eram baseados em modelos de produção dos anos 1930 até 1960 (Willys Coupe 1940-41, Studebaker 1937-41, Willys 1933 e o Ford Anglia), a aparência distinta ficava por conta da adoção de um eixo de feixe de molas na dianteira, o mais comum era adaptar ao chassi o eixo rígido de uma picape ou caminhão. 
Aumentar a altura do motor e deixar o entre-eixos mais curto criava um centro de gravidade mais alto, em teoria, essa nova distribuição de peso ajudaria na tração e aceleração. Para completar a receita eram adotados pneus finos e pequenos na dianteira e bem maiores na traseira. Tudo para aumentar a aderência na arrancada.
No visual eram adotadas pinturas com desenhos e cores chamativas, isso criava o visual “intimidating” que os fãs adoravam.
Não se sabe exatamente quem teve a ideia de levantar o motor e modificar o eixo dianteiro, mas os carros caíram rapidamente no gosto dos fãs até virar a primeira categoria específica de carros modificados. 
A medida que o esporte cresceu foram atraídos patrocinadores, principalmente fabricantes de componentes de motores que usavam as corridas para promover seus produtos, o crescimento da categoria ajudou na criação da National Hot Rod Association (NHRA) em 1951, uma entidade voltada a organizar, promover e criar regras para a modalidade de corridas de arrancada.
Os Gassers tornaram-se a categoria mais popular da NHRA até que, em 1967, foram adotadas novas regras que mudaram o seu destino. 
Passaram a serem aceitos carros feitos com chassis tubulares e carrocerias de fibra de vidro, não sendo mais obrigatório um carro “de verdade” como base do projeto. Desta forma a aparência dos carros foi ficando cada vez mais distinta até chegar ao que estamos acostumados atualmente como “Funny Cars”.
Ao longo da década de 1970 a categoria gassers perdeu o apelo entre as “top” da NHRA, mas ainda vivem através de campeonatos regionais, clubes locais de hot rods e do amor de muitos aficionados que não deixam a história e o espírito rodder se perder...

14/11/2016

Spirit of Ecstasy

Nos primeiros anos do século 20 o radiador era o local preferido pelas fábricas para colocar o emblema da marca, poderia ser na grade, na parte superior ou na tampa. Muitos clientes também gostavam de criar alguma forma de distinção e faziam suas próprias “criações artísticas”. Não podemos esquecer que nesta época o automóvel não era considerado apenas um “meio de transporte”, era muito mais um símbolo de status ou diversão para poucos afortunados.
Os primeiros modelos da Rolls-Royce utilizavam apenas o emblema da marca na parte superior do radiador, mas logo entenderam que só isso não seria suficiente para agregar prestígio e distinção aos seus clientes, era necessário reforçar a imagem de luxo e sofisticação.
A resposta veio com o famoso adorno de radiador com uma figura feminina de prata, o “Spirit of Ecstasy”, também chamado de "Emily", "Silver Lady" ou "Flying Lady".
Poucos sabem, no entanto, que a lady de prata guarda a história de um amor secreto entre um nobre e uma plebeia, história que permaneceu praticamente oculta por mais de uma década, exceto por um pequeno circulo de amigos.
John Walter Edward Douglas-Scott-Montagu, o segundo Barão Montagu de Beaulieu, em 1905 era um pioneiro do movimento do automóvel e editor da revista “Car Illustrated”. O barão tinha uma secretária de 22 anos chamada Eleanor Velasco Thornton, também conhecida como Thorn, eles se apaixonaram quando ela trabalhava para ele na revista.
Muitos justificam que a razão para a relação ter ficado em segredo foi a situação social e econômica de Eleanor, ela vinha de uma família muito pobre e uma relação com um nobre não era bem aceita pela sociedade da época. Mas, provavelmente, a razão verdadeira foi outra, pois o Barão Montagu era casado com Lady Cecil Victoria Constance Kerr desde 1889...
Para eternizar o seu amor o Barão Montagu encomendou ao escultor e amigo Charles Robinson Sykes, graduado no “Royal College of Art de Londres” e que trabalhava em Londres com patrocínio do nobre, um adorno personalizado para o capô de seu Rolls-Royce Silver Ghost, 1910.  
Sykes escolheu, ou foi aconselhado, a utilizar Eleanor Thornton como seu modelo. A estatueta foi desenhada com roupas esvoaçantes e a mão nos lábios sendo chamada “The Whisper” (O sussurro), hoje está em exposição no Museu Nacional Motor em Beaulieu. Apenas três ou quatro peças foram fundidas e destas acredita-se que apenas duas sobreviveram.
Na mesma época a Rolls-Royce estava preocupada com alguns proprietários que estavam criando ornamentos "inapropriados" para seus carros. Claude Johnson, então diretor executivo da marca, foi encarregado de buscar um novo adorno mais digno e gracioso para tornar-se uma marca genérica da Rolls-Royce.
Johnson também fez uma encomenda para Sykes, com as especificações que deveriam transmitir "o espírito da Rolls-Royce”, ou seja, a “velocidade com o silêncio, ausência de vibração, aproveitamento misterioso de grande energia e um organismo vivo bonito de excelente graça...".
Charles Sykes mostrou algumas ideias para Claude Johnson, mas os resultados não impressionaram. Foi então que Sykes sentiu que uma representação feminina seria mais apropriada e decidiu modificar “The Whisper”. O primeiro modelo foi chamado de “O Espírito de velocidade”, mais tarde “Spirit of Ecstasy”.
Henry Royce, um dos fundadores da marca, no início achou que a estatueta não iria agregar nada aos carros, na verdade afirmava que prejudicava a visão do motorista, mas em 06 de fevereiro 1911 foi finalmente apresentado para a Rolls-Royce o "Spirit of Ecstasy", não era difícil notar a semelhança com o "The Whisper”, afinal ambas as obras utilizaram a mesma modelo.
Entre 1911 até 1914 o adorno era prateado feito com níquel ou liga de cromo para não incentivar roubos, apesar de ser considerado um acessório quase todos os modelos adotavam até virar um item de série no começo dos anos 1920. A Rolls-Royce assumiu a fundição das figuras em 1948, até 1951 a fábrica manteve a inscrição com o nome do artista.
Ao longo de sua história o desenho teve onze variações, principalmente em função das mudanças nas carrocerias que levaram a reduções no tamanho da mascote. Em 1930 Sykes foi novamente encarregado pela fábrica de criar uma versão menor para permitir uma visão mais clara para os motoristas. Então em 26 de Janeiro 1934 foi apresentada uma versão agachada, mas depois voltou a posição original e assim permanece até hoje.
A partir de 2003 foi adotado um modelo padrão de 3 polegadas, por segurança o adorno passou a ser montado sobre um mecanismo de mola projetado para retrair instantaneamente se for atingido de qualquer direção. Também existe um botão no painel para aumentar ou diminuir a altura do emblema quando pressionado.
Como ícone da sofisticação da marca, ela pode ser feita de aço inoxidável polido, banhado a ouro com 24 quilates ou de cristal fosco iluminado, também existem versões personalizadas em uma pintura preta fosca ou cravejado em diamantes.
Mas, como finalizou a história de amor entre Eleanor e o Barão Montagu?  Infelizmente de modo trágico, ela morreu em 30 de dezembro 1915 no naufrágio do navio SS Persia, torpedeado por um submarino alemão ao sul de Creta. Eleanor voltava de uma viagem com Lord Montagu, que assumira um comando na Índia durante a primeira guerra mundial. Ele também foi dado como morto, mas sobreviveu após vários dias à deriva em um bote salva-vidas.
Apesar de tudo, seu amor foi eternizado, o Barão Montagu atingiu o seu desejo.